sábado, 7 de janeiro de 2012

Crise, oportunidade de sermos aliados e não concorrentes


É no calor da provação que podemos encontrar um grande aliado

Onde existem pessoas há também divergências. É natural! Simplesmente porque não somos iguais. E conforme ocorrem os fatos do cotidiano, as disparidades entre os seres humanos vão sendo estampadas. Entretanto, infelizmente em algumas vezes, essas diferenças ficam à mostra por força de desentendimentos. “É impossível que não haja escândalos” (Lc 17, 1).
Administrar tensões entre pessoas não é fácil nem mesmo em condições favoráveis, contudo, os conflitos de opinião, de temperamentos, as ideais opostas, entre outros, tornam-se ainda mais pontos frequentes de intolerância quando se atravessa uma crise.
Nas situações confortáveis, os ânimos entre pessoas em desacordo podem ser mais suportáveis, afinal, existem outras condições propiciadas pelo meio ambiente que são compensatórias. Pratica-se a política da boa vizinhança. O indivíduo adapta-se a algo que acha ruim no outro e faz a opção de conviver com isso para manter um benefício que seja comum a ambos. É viver algo do tipo “manual de sobrevivência, política da boa vizinhança”. As pessoas não se envolvem na vida das demais, para não necessitarem entrar nos pontos conflitantes. Sabem que os possuem, mas assim, evitam atritos, “fingindo” que está tudo bem.
Por outro lado, na dificuldade, a compensação não existe ou é escassa, então, a tendência dos seres humanos é de voltarem-se uns contra os outros. Passa a valer o pensamento “cada um por si” e “salve-se quem puder”. A guerra é declarada, a competição instalada. Dessa forma, apontam-se os erros uns dos outros, todos buscam uma forma de esquivar-se da responsabilidade daquilo que não deu certo e tentam mostrar que o culpado pelo desacerto é aquele que se tornou seu opositor.

Interessante notar que a crise vem quase sempre de um fator externo que influencia negativamente o núcleo da instituição onde estamos - casamento, empresa, associação ou comunidade – e que deixamos atingir o âmago da identidade nas pessoas envolvidas.
Algumas vezes, nem precisamos estar em pé de guerra com alguém para colocarmos as garras de fora. Basta que a situação confortável fique ameaçada para mudarmos de atitude com o próximo.
Até mesmo na amizade ou em bons relacionamentos em que não prevalece essa má impressão de um para o outro, quando passamos por uma crise, ferimos as pessoas e primeiro tentamos salvar a nós mesmos. O amor acaba quando somos "desinstalados" e provados com a justificativa de “amigos, amigos, negócios à parte”.
Porém, é justamente na crise que a concórdia e a parceria precisam funcionar. Essa é a hora de as diferenças serem somadas e colocadas a proveito do conjunto. Qualquer que seja a instituição ou dificuldade em que nos encontrarmos com o outro, é pelo trabalho e pela soma dos esforços das pessoas envolvidas que obteremos a solução.
Se os desafetos forem deixados em segundo plano e mesmo contra a vontade, num primeiro momento, os seres humanos moverem-se com o propósito de fazer dar certo, a força propulsora de qualquer empreendimento estará focada e concentrada num objetivo. Então, as chances de tudo sair bem e atravessarem a crise aumentarão e muito.
Além do que, nessa associação de esforços, as qualidades dos conflitantes serão percebidas por eles mesmos, mais facilmente. Talvez um ponto que nunca se tenha visto em alguém fique a partir daí evidente.
É no calor da provação que podemos encontrar um grande aliado e as potencialidades são reveladas. Da diferença que temos com alguém, podemos descobrir uma riqueza que nos completa.
Deus o abençoe!

Nossas escolhas e suas consequências


Sentir o peso das próprias escolhas é profundamente pedagógico

É interessante perceber como, atualmente, a maioria das pessoas tem uma grande dificuldade para lidar com as consequências de suas escolhas. Sim, vivemos uma concreta crise no senso de responsabilidade, em que muito se escolhe e pouco se quer arcar com as consequências do que se escolhe.
É notória a necessidade manifestada por muitos de, consciente ou inconscientemente, sempre procurar culpados para justificar os próprios sofrimentos, não aceitando que estes, muitas vezes, são diretas consequências das más escolhas que nós fizemos em nossa trajetória pela vida.
É muito mais fácil culpar a alguém por nossos infortúnios – principalmente a Deus –, contudo, ancorado em tal prática o coração nunca poderá verdadeiramente crescer, pois ficará encarcerado em um imaturo – e infantil – sistema de autodefesa e justificação, que retirará do ser toda a responsabilidade pelas escolhas realizadas, fazendo-o descarregar sobre os outros as suas consequências.
Precisamos, mais do que nunca, aprender a arcar com as consequências de nossas escolhas, sabendo que somos os reais protagonistas de nossa existência e que esta só poderá acontecer com qualidade, se por ela (qualidade) decidirmos em cada fragmento que compõe o nosso todo.
Faz-se real em nosso tempo a necessidade de fortalecer a própria vontade. Sim, de resgatar a capacidade de escolher com clareza, tendo diante de si a consciência concreta das consequências do que se escolhe. Nossa vontade precisa ser forte, pois só assim ela poderá acontecer com liberdade e segurança, sem ser condicionada por vícios e más paixões que a deixem opaca e fragmentada.
A maturidade só poderá fazer-se presença na história de quem tiver honestidade o bastante para lidar com as reais consequências do que escolheu, pois, ao contrário, a infantilidade será uma contínua companheira que fará o olhar – sempre e em tudo – contemplar a vida sob uma ótica imprecisa e autopiedosa.
Diante disso, acredito que os pais precisam permitir aos filhos enfrentarem todos os sofrimentos causados por suas más escolhas, pois, se os ausentarem disso, eles nunca conseguirão crescer e acabarão aprisionados a uma intensa imaturidade: mimados e sem uma reta consciência das consequências daquilo que na vida eles realizaram o ofício de escolher.
Sentir o peso das próprias escolhas é profundamente pedagógico e formativo para toda e qualquer pessoa, é experiência que nos faz mais autônomos e livres, para assim podermos nos construir com responsabilidade e consciência, como autênticos seres humanos.
É extremamente necessária esta compreensão: Muito em nossa história dependerá de Deus e dos outros, contudo, muito também depende somente de nós e das escolhas que fizermos e, culpar os outros pelo que em nossa vida não é tão bom não eliminará definitivamente as dores e problemas que configuram nossos dias.
Enfrentemos nossa história e suas consequências sem medo, e, aprendamos com os erros passados a verdadeiramente construir as vitórias e realizações que o futuro reserva para cada um de nós.

Padre Adriano Zandoná

Nossos milagres de cada dia


De fé, de amor, de transformação, de vida cristã

Existe uma ambiguidade que caracteriza aos sinais e milagres de Jesus Cristo. Por um lado, os Evangelhos estão cheios de milagres. O caminho de Jesus está marcado por acontecimentos prodigiosos: os cegos recobram a vista, os coxos andam, os leprosos ficam limpos, os mortos ressuscitam. Por outro lado, Cristo é reticente com os milagres. Multiplica os sinais, mas não pretende apresentar-se como taumaturgo. Vem para trazer a salvação, não para fazer milagres. Evita todo sensacionalismo, se nega decididamente ao espetacular.

Se miramos atentamente o Evangelho, podemos dizer que existem duas coisas que são capazes de Lhe arrancar milagres: a fé dos que pedem e a miséria dos homens.

1. A fé de quem pede. Um rosto que implora com fé é um espetáculo diante do qual Cristo não pode resistir. É Seu ponto "débil". Deixa escapar expressões de admiração: “Mulher, que grande é tua fé!” E não pode evitar realizar o milagre: “Faça-se segundo teus desejos...”

2. A miséria humana. Quando Jesus se encontra pelo caminho com a miséria, sente-se quase obrigado a regalar o milagre. Em muitos casos, nem sequer é necessário que formulem um pedido explícito. Basta a presença da dor, como por exemplo, as lágrimas de uma mãe que acompanha o sepulcro de seu único filho. E Cristo responde imediatamente. Não pode ver como os homens sofrem. Tratando-se de nós, há cristãos que querem ver milagres a todo custo.

Como se sua fé estivesse pendente, mais que da Palavra de Deus, dos milagres. Sua vida se desenvolve sob o signo do extraordinário, do excepcional, às vezes, até do extravagante. Não compreenderam que a fé é o que provoca o milagre. E não o contrário. Alteraram o procedimento de Jesus. No Evangelho aparece com claridade que o Senhor ressalta a liberdade, deixa a porta aberta, sem obrigar ninguém a entrar, sem golpes espetaculares. Ele é vencido só pela fé dos homens.

Mas existe também uma postura contrária, também fora de sintonia. São cristãos que têm medo, que quase se envergonham do milagre. Pretendem impedir que Deus seja Deus. Gostariam de aconselhar-Lhe que não é oportuno, que é melhor, para evitar complicações, deixar em paz o campo das leis físicas. Como se Deus estivesse obrigado a pedir-lhes conselho antes de manifestar Sua onipotência.

Esquecem que os milagres são a expressão da liberdade de Deus. Nossos milagres. Por cima destas atitudes diante dos milagres e sinais de Deus, está a obrigação precisa para todos nós: Cristo nos deixou a recomendação de fazer milagres. É o “sinal” de nossa fé. Mais ainda, havemos de “converter-nos” em milagres: Milagres de coerência, de fidelidade, de misericórdia, de generosidade, de compreensão.

Uma vez mais esta “geração perversa pede um sinal”. E tem direito de esperá-lo de nós, os que nos chamamos cristãos. Que sinal podemos oferecer-lhes? Que milagre podemos apresentar-lhes? Uma resposta ao mundo que nos rodeia. Nosso caminho passa por um mundo que tem fome, fome de pão e fome de amor. Um mundo enfermo de desilusões. Um mundo cego pela violência. Um mundo assolado pelo egoísmo.

Não podemos passar por esse caminho limitando-nos a contar aos demais os milagres de Jesus. Não podemos contar com seus milagres. Havemos de contar com os nossos.

O que buscam os homens deste mundo são nossos milagres de cada dia: nossos milagres de fé, de amor, de transformação, de vida cristã.
Padre Nicolás Schwizer